domingo, 15 de julho de 2007

A Morte de Frances - Cap. 1 : O Nascimento de Frances

A Morte de Francis

CAPÍTULO UM

O NASCIMENTO DE FRANCIS

Muitas famílias desejam ter filhos. Outras não. Muitas vezes um filho é a única esperança que uma família tem de continuar unida, ou de encontrar a felicidade. Paradoxalmente, muitas famílias encaram o nascimento de um filho como uma benção divina, outras como um evento indesejado, ou um castigo. Alguns têm filhos como interesses monetários. Outras acreditam que isso é um mero acontecimento biológico, reprodução da espécie. Para algumas pessoas, porém, um filho não significa nada.

O dia estava pacato como sempre. Todas as famílias que moravam naquela adorável alameda estavam em suas respectivas casas, onde repousavam naquela bela tarde de domingo. O dia era, absolutamente, um dia qualquer. Exceto para aquele adorável casal, que naquele dia teria um filho. Ou não.

Francis nasceu. Não foi espetacular. Nem mesmo emocionante. Ninguém chorou, nem o próprio bebê. “Foi melhor assim” pensou o pai de Francis. As enfermeiras e os médicos se perguntavam como um casal tão adorável teria um bebê tão mirrado e sem graça quanto aquele. “Espero que continue assim” pensou o pai de Francis. De fato ele estava certo.

Seu nascimento não foi noticiado. Nem festejado. Muito menos planejado. Durante um pôr-do-sol de domingo Francis foi concebido. O hospital estava vazio. O belo casal chegou de forma bem tranqüila, como se tivessem ido à esquina comprar um maço de cigarros. “Espero que eles tenham televisão” pensou o pai de Francis. Novamente ele estava certo.

O hospital estava vazio, como de costume. Os funcionários conversavam discutindo o último capítulo daquela novela, assunto que gerava comoção geral. Aconteceu certa agitação com a chegada da família de Francis, já que era um fato raro clientes naquele pequeno hospital suburbano. A família foi atendida por uma horda de desocupados, que levaram a mãe para a sala de cirurgia, enquanto o pai, irritado, resolvia as burocracias. Todas as enfermeiras pareciam muito mais empolgadas que o próprio casal, que parecia aborrecido com a situação inusitada. Resolvidos os problemas burocráticos (e monetários, com tremendo desgosto), o pai de Francis se contentou que teria que esperar, assistindo à televisão com os outros funcionários. Freqüentemente checava o relógio, com esperanças que pudesse chegar à casa a tempo de ver o futebol.

Não houve problemas durante o parto. A mãe de Francis foi anestesiada. Ela se recusou a sentir até a dor. A única coisa que se ouvia no hospital era a televisão da sala de espera, na qual o pai de Francis esperava que o parto acabasse irritado com falta de conforto das poltronas. A televisão noticiava um homicídio que ocorreu na noite anterior. Um garoto, viciado em drogas, matou os pais durante uma crise de abstinência. “Tomara que acabe logo” pensou o pai de Frances. Continuou correto.

O parto foi rápido, para alivio do médico, que estava no final do seu plantão quando o casal chegou. Simplesmente concluiu seu serviço, entregou o bebê nas mãos da enfermeira assistente e saiu apressado para chegar logo em casa com esperanças de assistir ao futebol. De forma bem grosseira o médico entregou a criança nos braços da enfermeira mais próxima, sem todo aquele romantismo que é comum em filmes. A enfermeira, por sua vez, checou o sexo do bebê, e descobriu que era um menino. Em sua mente veio à lembrança de seu parto, e como em todos os partos que já participara, deixou escapar lágrimas de alegrias ao ver aquela nova vida florescer.

- É um menino! – Disse à enfermeira que parecia ser a única a esboçar um sorriso em todo o hospital.

- É... – Respondeu a mãe, sem um pingo de empolgação.

A mãe, ao contrário da enfermeira, não parecia muito feliz. Nem ao menos pegou o filho em seus braços, como normalmente é feito após o parto. “Coitado do bebê, tão feinho” pensou a enfermeira, que o mantinha seguro em seus braços. Francis era pequeno demais para um bebê normal, parecia que seu desenvolvimento não fora completo, apesar de ter passado nove meses inteiros na barriga de sua mãe. Lembrava um boneco velho que só respirava.

O primeiro banho foi administrado na sala do parto, onde Francis finalmente esboçou alguma reação. Parecia gostar da água, apesar do pouco contato que tivera. A enfermeira estranhou, nunca tinha visto um bebê se manifestar positivamente daquela forma durante o primeiro banho. “Parece que ele gosta de água, então” pensou ela, corretamente.

O mirrado bebê foi levado para o berçário, onde ficou sozinho, ele era o único que havia ali. A enfermeira tinha esperanças de que o pai ou a mãe fossem vê-lo, mas ela desistiu logo. “Devem estar cansados” pensou ela. “Um bebê tão feio para um casal tão bonito e simpático, é uma pena” pensou novamente. Todas as enfermeiras estavam realmente empolgadas com Francis. Fazia um tempo razoável que não aparecia um bebê por ali. Porém, todas elas perdiam o ânimo bem rápido, quando davam uma breve olhada nele. Não era bonito, nem fofinho, muito menos engraçado. Parecia morto, muitas vezes, se não fosse a respiração.

Depois do parto o pai de Francis voltou para casa, que não era muito longe dali, já que procuraram a maternidade mais próxima da casa. A mãe de Francis passou a noite lá, para observação. Com a chegada da noite Frances começou a se manifestar. A enfermeira que cuidava do berçário a noite estava espantada, a criança que parecia um brinquedo sem vida finalmente manifestava alguma humanidade. Isso a deixou feliz, geralmente os bebês alegravam um pouco o lugar e deixavam o serviço menos monótono. Porém, sempre que ela se aproximava de Francis ele não demonstrava felicidade, muito pelo contrário, Francis chorava. De forma muito interessante aquela criança se entretinha sozinha.

No dia seguinte a mãe de Francis teve alta. Todos na maternidade estranharam não aparecer nenhum parente, nem amigo da família. Como aquele casal tão adorável não tinha nenhum familiar tão adorável quanto para visitar o rebento? Todos os funcionários da maternidade ficaram satisfeitos com a saída de Francis e sua família. Depois do seu nascimento a maternidade parece ter entrado em um clima muito soturno.

Com a saída de Francis e sua família do hospital os funcionários ficaram de certa forma mais tranqüilos. Havia um sentimento geral de decepção. Como um casal tão adorável poderia ter um filho como aquele? A criança que parecia ser a última chance daquela pequena maternidade de recuperar um pouco de alegria falhou. Agora todos pareciam mais abatidos que o normal. Poucas semanas depois a maternidade fechou.

A família retornava para casa no carro, a mãe carregava o filho de forma displicente, sem ligar muito. O bebê permanecia em silêncio.

- Já escolheu o nome? – Perguntou o pai, de forma mal humorada.

- Frances – Respondeu a mãe com igual mal humor.

- Por que esse nome?

- Eu vi na televisão uma vez – Respondeu ela novamente, sem nem sequer olhar para seu filho.

Frances foi batizado na Igreja Católica. Os pais não sabiam realmente por que fazer aquilo. Mas fizeram de qualquer forma. Durante o batismo os pais de Frances o viram chorar pela primeira vez. “Que criança estranha” pensou o padre. Durante o batismo ocorreu à família o mesmo clima que durante o nascimento. “Espero que acabe logo” esse pensamento passava muito pela cabeça dos pais de Francis. Era realmente muito estranho, eles não queriam estar ali, batizando o único filho, mas o dever católico era mais forte, quase como uma obrigação. “O que os vizinhos vão falar se não batizarmos nosso filho?” pensava o pai de Francis.

A maternidade na qual Francis nasceu não durou muito. Algumas semanas após seu nascimento, ela faliu por falta de clientela. No seu lugar construíram uma bela e vistosa lanchonete. Que também não teve muita sorte, sempre acontecia uma briga entre jovens bêbados, ou assaltos, resultando na falência da lanchonete. O prédio então foi adquirido pelo governo, que o transformou em um abrigo para artistas falidos.

Será que Francis fazia mal ao mundo? Ou o mundo fazia mal a Francis? Essa foi a herança deixada a ele. A dúvida e os olhares tortos. O mau agouro, a sensação de que sua vinda ao mundo não era uma benção, e sim uma maldição. Francis nasceu, e isso não significou nada.

2 comentários:

Maricot's disse...

Alô, Frances!
Alô, KK!
Alô, Brasil.
Alô doçura.

Eu acho Frances bem legal. Tipo, de vez em quando não. XD

MAS FICOU DEMAIS.
Mas não importa não é?Frances nasceu, e isso não significou nada...

Anônimo disse...

Ele vai se chamar Frances ou Francis???
Bem, no final, isso não vai significar nada...
Está muito legal seu livro e estou louco pra ler a continuação. Vai demorar muito, tipo... você já tem mais alguma coisa pronta ou não escreveu mais nada?

tá muito bom msm!
abraço!